Cabo Verde tem condições legais e infraestruturais para a moeda eletrónica, mas os serviços de pagamento tendencialmente gratuitos são o maior constrangimento para essa implementação, segundo um estudo hoje apresentado.
O estudo diagnóstico das finanças digitais em Cabo Verde e a implementação do “mobile money” (moeda eletrónica) foi apresentado pelo economista Vasco Marta, durante o II Fórum de Microfinanças, organizado na cidade da Praia pelo Banco de Cabo Verde (BCV).
A análise apontou alguns pontos fracos e concluiu que os serviços de pagamento tendencialmente gratuitos (abertura de conta, depósitos, levantamentos, balcão e ATM) são os maiores constrangimentos para a implementação da moeda eletrónica no arquipélago.
A somar a isso, há a reduzida dimensão do mercado, com menos de 600 mil habitantes, elevada taxa de bancarização (78,7%), extensa rede de agências/balcões de bancos comerciais, com presença em todos os concelhos do país, e a boa cobertura do território pela rede de ATM.
No relatório preliminar, o economista reformado do BCV apontou ainda como pontos fracos os custos de autorização, instalação e financiamento de uma entidade/empresa autónoma, a presença de um operador no mercado, Banco BAI/Makeba, e a existência de algumas zonas sombras não cobertas pela rede móvel, principalmente nas zonas mais remotas.
Por outro lado, o estudo apontou pontos fortes para a moeda eletrónica em Cabo Verde, como sendo uma população jovem e aberta à assimilação de novas tecnologias, elevada taxa de população na economia informal e utilização generalizada de dinheiro vivo nas transações.
A boa cobertura do território pela rede de comunicação móvel, alta taxa de penetração dos telemóveis e o facto de as instituições de microfinanças estarem em processo de digitalização das suas operações são apontadas como outros pontos fortes por Vasco Marta, que já foi presidente do conselho de administração da Sociedade Interbancária e Sistemas de Pagamentos (SISP).
E como oportunidades, apontou a possibilidade de agregar mais serviços, utilização da plataforma por outros prestadores de serviços, expandir o serviço para os cabo-verdianos no exterior e aproveitar as oportunidades que a progressiva digitalização do país irá oferecer.
Mas o consultor também encontrou como ameaças a aceleração do processo de bancarização, entrada de novos operadores no mercado e a formalização da economia.
O estudo mostrou três critérios para a moeda eletrónica em Cabo Verde, começando com a instalação de uma infraestrutura de raiz, com processamento e alojamento e operada nas suas instalações, com equipamentos e uma equipa de 21 colaboradores.
A segunda é idêntica à primeira, mas com alojamento em ‘nuvem’, com 17 colaboradores e sem equipamentos, enquanto a terceira seria a instalação de ‘software’ e serviço prestado por uma entidade terceira.
Entretanto, Vasco Marta alertou que não é recomendável a instalação de raiz de uma entidade, explicando que todos os cenários são inviáveis nos primeiros cinco anos, o que iria exigir a injeção permanente de capital por parte dos acionistas ou outras entidades.
Assim, antes de avançar com a implementação de um serviço de moeda eletrónica de raiz, recomendou o aproveitamento das iniciativas e infraestruturas existentes neste momento, nomeadamente Makeba, SISP e o banco Caixa Económica de Cabo Verde (CECV).
“A única coisa que terá que se garantir é que esse serviço será oferecido a todas as instituições em igualdade de circunstâncias”, concluiu Vasco Marta.
O governador do BCV, Óscar Santos, disse que Cabo Verde tem condições legais e infraestruturais para avançar para a ‘mobile money’, mas que ainda falta mais acesso à tecnologia e formação.
“Realizar transações através de, por exemplo, um ‘smartphone’, como pagamentos numa loja física ou ‘online’ ou transferências instantâneas, é uma prática cada vez mais generalizada nos diferentes continentes. A transformação digital é uma realidade incontornável”, salientou.
Em Cabo Verde, o governador considerou que a moeda eletrónica é um “passo quase que inevitável”, faltando trabalhar a questão da supervisão, do controlo e de segurança.
O II Fórum de Microfinanças tem como tema central “A Transformação das Instituições de Microfinanças e os Desafios da Economia Digital no contexto da pandemia Covid-19”, pretendendo ser um espaço de diálogo e socialização de assuntos atuais, com vista à criação de um ambiente favorável ao desenvolvimento da atividade de microcrédito e afins.
É realizado pelo BCV, em parceria com a Associação Profissional das Instituições de Microfinanças de Cabo Verde e o Projeto de Apoio ao Desenvolvimento das Finanças Inclusivas, financiado pela cooperação luxemburguesa.
Por: Lusa