Um relatório do Departamento de Estado norte-americano reconhece que Cabo Verde “não cumpre integralmente os padrões mínimos” para a eliminação do tráfico de seres humanos, mas admite que o Governo “está a envidar esforços significativos para o fazer”.
No relatório anual sobre a situação do tráfico de seres humanos em 188 países, divulgado, o Departamento de Estado volta a classificar Cabo Verde no nível dois (de quatro), o mesmo em que se encontra desde 2018.
“O governo demonstrou esforços crescentes em comparação com o período do relatório anterior, considerando o impacto da pandemia de covid-19 na sua capacidade de combate, portanto Cabo Verde manteve-se no nível dois. Estes esforços incluíram a elaboração de procedimentos operacionais padrão para a identificação das vítimas e encaminhamento para os serviços”, lê-se no documento.
O relatório acrescenta que as autoridades cabo-verdianas identificaram e encaminharam para atendimento potenciais vítimas de tráfico, nomeadamente crianças, e deram continuidade aos processos judiciais contra os supostos autores.
“No entanto, o Governo não cumpriu os padrões mínimos em várias áreas-chave. A partilha de dados e a coordenação entre agências governamentais permaneceram fracos”, refere ainda, reconhecendo que o recente observatório para monitorizar e identificar situações de tráfico de pessoas, “embora pretendesse liderar os esforços nacionais, na prática não coordenou as atividades de combate ao tráfico de forma adequada”.
“As agências governamentais encarregadas de combater o tráfico continuaram a carecer de recursos e formação”, acrescenta.
O Departamento de Estado norte-americano defende como prioridade para Cabo Verde a investigação “vigorosa” dos crimes de tráfico de seres humanos, bem como “responsabilizar traficantes, traficantes de sexo e turistas sexuais”, garantir que “todos os casos de tráfico” sejam julgados “sem interferência política, em vez de resolvidos por meios não judiciais”.
“Adotar, implementar e treinar polícias, inspetores do trabalho e outros funcionários no projeto de procedimentos padronizados para identificar proativamente as vítimas do tráfico – incluindo populações vulneráveis, como migrantes da África Ocidental, trabalhadores chineses e profissionais médicos cubanos – e encaminhá-los para atendimento”, lê-se ainda, nas ações prioritárias definidas no relatório.
Num país fortemente dependente do turismo, as autoridades norte-americanas apontam a necessidade de Cabo Verde “fortalecer a cooperação internacional na aplicação da lei para prevenir e investigar casos de turismo sexual infantil” e para “aumentar os esforços para aumentar a consciência pública sobre o tráfico de pessoas, incluindo tráfico sexual de crianças e servidão doméstica”.
Globalmente, o relatório refere que, tal como nos últimos cinco anos, “traficantes de seres humanos exploram vítimas estrangeiras em Cabo Verde e, em menor grau, vítimas cabo-verdianas no estrangeiro”.
“Traficantes exploram meninos e meninas, algumas das quais podem ser estrangeiras, no tráfico sexual em [ilhas] Brava, Santiago, Fogo, Sal, São Vicente e Boa Vista, às vezes através do turismo sexual infantil”, acrescenta, reconhecendo que no passado foram relatados casos de turistas perpetrando abusos sexuais sobre crianças, em alguns casos encorajados pelos pais em práticas de sexo pago com turistas.
Além disso, são relatados casos de crianças cabo-verdianas envolvidas em “mendicância, trabalho doméstico, venda ambulante, lavagem de carros e a agricultura”, recordando o documento que o código penal de Cabo Verde criminaliza o tráfico sexual e o tráfico de pessoas para mão-de-obra com penas de quatro a 10 anos de prisão.
No relatório é reconhecido que durante o último ano foram iniciadas investigações em Cabo Verde “sobre um suposto caso de tráfico envolvendo uma trabalhadora doméstica estrangeira”, continuaram em investigação 12 outros casos, iniciou-se um processo contra um suspeito e continuaram os processos contra pelo menos outros três.
Contudo, “pelo segundo ano consecutivo, os tribunais não condenaram nenhuma pessoa por tráfico de seres humanos”, apesar de ter sido concluída uma investigação iniciada durante o período de relatório anterior, sobre um suposto traficante que explorou sexualmente a sua filha de 14 anos.
Foram ainda acusadas de tráfico de pessoas e emprego de trabalhadores estrangeiros sem documentos, na ilha do Sal, outras três pessoas, que aguardavam por julgamento.
Por: Lusa